quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Ela já não gosta mais de mim

Aos 2 anos e 7 meses de idade, ontem ela me disse pela primeira vez, após ser contrariada (não pela primeira vez):

- Não gosto de você.

E ainda concluiu, sem que eu esboçasse reação alguma:

- Porque você é... feia.

- Então a mamãe vai ficar triste, filha.

- Ah. Fica feliz, mamãe. (Com cara de pouco caso).

- Só posso ficar feliz se você gostar de mim.

- Tá. Eu gosto de você. (Com cara de consolação).

É, foi isso. Mas eu gosto dela mesmo assim.

Mas eu não vou chorar
Eu vou é cantar
Pois a vida continua...


segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Bah! Turismo no Rio

Outro dia, conversávamos no café da manhã, e eu dizia:

- Bah, filha, você viu que... (blá blá blá)?

E ela me respondia:

- Bah, mamãe! Bah... (blá, blá, blá).

Eu digo "bah" com uma frequência que os onze anos morando no Rio não abalaram, mas minha filha, que é carioca e só tem dois aninhos, não costuma usar a expressão gaúcha. Mas naquele dia ela achou divertido e saiu usando "bah" como se tivesse nascido nos pampas. Batemos um longo papo em gauchês, até que ela, muito compenetrada, subitamente questionou:

- O que é "bah", mamãe?

Dei muita risada, e para explicar foi difícil. Gaúchos nascem com o "bah" na garganta, e eu diria mais: nos olhos. Tudo que nos surpreende é bah; tudo que nos comove, assusta, constrange, desconcerta, bah, baaaaah! De alegria e de tristeza, bah. De sorte e azar, mas bah! De encontros breves e uniões eternas, barbaridade, sobre guerra e paz, pesadelos profundos e piadas rasteiras, bah, bah...

Se já é difícil definir o bah que dizemos, mais ainda é o bah que vemos.

- Filha, sabia que a mamãe nasceu em um lugar bem longe daqui?

- É? E você não demorou muito, mamãe?

Bah! Achei que ainda não era o momento de explicar a ela as tradições gaúchas. Chegará o dia.



Pão de Açúcar - Visto do Parque do Flamengo

**

Depois de vários dias de chuva, tivemos um fim de semana espetacular no Rio. E, depois de muitos anos, voltei a alguns pontos turísticos que me lembraram da primeira vez em que estive aqui, em 1987 (!).








(Vista do Pão de Açúcar)

Eu era uma turista-mirim absolutamente encantada, que jamais imaginava morar aqui um dia.

E muito menos ter uma carioquinha para chamar de minha. BAH!







Jardim Botânico

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O rabinho do Joaquim

Hoje ela viu um menininho fazendo xixi na pracinha.

- Olha, olha! O xixi sai pelo rabinho do Joaquim!

Chegou em casa, entrou no banheiro e foi logo perguntando:

- Cadê o meu rabinho?

Frase típica de pai: "Se eu pego esse Joaquim!".

Frase típica de mãe: "Se eu pego esse tal de Freud!".

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Tirar as fraldas - as minhas, inclusive

Cansei de ler dicas e mais dicas sobre como tirar as fraldas da criança. Perceber os sinais de que ela está pronta, ter paciência, ser constante, não fazer drama quando o xixi “escapa”, etc. Há quem diga que a estação do ano (calor) é fundamental; outros garantem que é irrelevante: se está na hora, está na hora e pronto.

Para além de invernos ou verões, penicos, adaptadores e eventuais acidentes, porém, encontrei pouco conteúdo relevante. Fico me perguntando se sou a única mulher maluca que fica pensando – e sentindo – várias coisas relativas à intimidade da minha filha nessa fase. Intimidade mesmo. As crianças são pessoas de verdade.

Ou será que nós, adultos, muitas vezes as tratamos como se fossem massinhas de modelar?

Processo compartilhado

Minha filha está aprendendo a controlar a saída de um material que, até então, poderia muito bem ser considerado um defeito de fabricação: misteriosamente, uma fralda branquinha saía suja e voava para o lixo em um ritual mecânico cuja parte que lhe cabia era mínima. De pernas para cima, observava tudo, resmungava um pouco e, depois, voltava a brincar como se nada tivesse acontecido.

Agora, não. Ganhou dúzias de calcinhas e um aviso: virou menina crescidinha. “Igual à mamãe” – ela própria repetiu e repete, certamente sem ignorar a quantidade de cabelos, pelos, tamanhos, vozes e volumes que nos separam. Virou a protagonista dos seus líquidos e sólidos, ao mesmo tempo em que – recentemente! – está começando a orquestrar sua própria imaginação ao inventar diálogos entre as bonecas. Controlar as coisas que saem do nosso corpo e lidar com as que entram na nossa cabeça: ufa!, confesso que até hoje me atrapalho um pouco...

É tão óbvio – mas quase ninguém fala – que o processo de tirar as fraldas é, assim como tudo na maternidade, compartilhado. Nós duas estamos “desfraldando”. Aliás, aqui em casa, nós três estamos. Por mais que as regras, dicas e toques sejam extremamente válidos na hora do aperto (literalmente), a verdade é que cada criança é uma criança e, além disso, cada relação mãe/filho e pai/filho é uma espécie de “entidade” que conta muito, eu diria que praticamente define o processo.

A intimidade e o mundo

Será que estou exagerando? Pode ser, sou dada a exageros. Exatamente por isso, não consigo deixar de sentir, na minha própria pele, uma série de questionamentos sobre como eu lido com a intimidade e como isso norteia a minha relação com o mundo. Por uma questão de responsabilidade, me pergunto: em que ponto pode começar o nosso relacionamento com o mundo exterior, senão a partir da intimidade? Alguma coisa me diz que o processo de retirada de fraldas tem a ver com isso.

Não tenho nenhuma sugestão, proposta, dica ou carta na manga para tornar essa fase agradável – ou, como desejaríamos, o mais breve possível. Estou recém no início e já me vejo atrapalhada e perplexa. Às vezes, tenho sérias dúvidas sobre estar infernizando minha filha com os “convites” a comparecer no vaso sanitário regularmente, que a mim já estão enchendo a paciência, isso que não tenho um baú de brinquedos a me esperar no quarto ao lado. De qualquer forma, como diz minha mãe, “com a maternidade a gente repensa as próprias convicções o tempo todo”. Isso vale tanto para as situações em que ela faz xixi no chão - e não sei que cara fazer - quanto para meus momentos mais íntimos, sozinha no quarto, escrevendo ou pensando na varanda... E não sei que cara fazer.

Crianças são pessoas de verdade, e de verdade nos ensinam que, às vezes, o xixi escapa. Nossa capacidade de respeitá-las e conduzi-las, com firmeza e consistência, vai nos transformando de adultos que somos em adultos que podemos ser. Como massinhas de modelar.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Casaquinho do Papai

Conheci meu marido, o pai da Lara, através de um texto que ele escreveu e andou circulando pela internet entre nós, músicos. O maestro escrevia sobre o absurdo da sexualização infantil no “funk” – que, naquele tempo, era considerado pela grande maioria dos “formadores de opinião” como uma manifestação cultural da periferia, contra a qual era difícil se posicionar sem levar pedradas. Pois ele foi brilhante ao atacar, com critérios incontestavelmente musicais, o tal do funk. Arrasou.

Como era colunista de um grande site de jornalismo e opinião, aquele artigo sobre o funk fez um enorme sucesso e dividiu opiniões, gerou debates, foi encaminhado para as listas de discussão de músicos e produtores, causou polêmica. Esta cantora que vos escreve bateu o olho no texto e mandou uma mensagem para dizer: até que enfim alguém disse o que todo mundo gostaria de dizer e nunca disse! Saudações musicais recíprocas.

Nascia ali uma amizade virtual e uma sincera admiração intelectual que, alguns anos mais tarde, transformou-se naquilo que eu procurava a vida inteira, mas imaginava que só existia nos filmes – e nem ouso definir com palavras, porque nessas horas eu sou nojenta de tão clichê. (Olha aí, acabei de ser outra vez...).

CORTA PARA
Setembro de 2009, Bienal do Livro




Eis o livro que ele está lançando agora. Chama-se “Os Casacos Mágicos do Theatro Municipal”, e eu já li umas dez vezes. Adoro o texto. Aliso as páginas. Já me peguei com vontade de pentear as vírgulas, beliscar as bochechas dos pontos e dar banho nos travessões, como fazemos com a nossa filha. Só tem uma explicação, a mais boba: o livro é muito fofo!

Ele conta a estória de uma menina chamada Isabela, que vai – meio contrariada - assistir a uma ópera no Theatro Municipal e acaba vivendo uma aventura mágica no camarim. Dá para sentir o clima nesses trechinhos que eu, descaradamente, vou copiar aqui sem pedir permissão:

“Quando saímos da estação do metrô, eu vi ao longe o teatro e o monte de gente em frente para entrar. Ele é bonito, alto, parece um castelo antigo, só que mais enfeitado e cheio de luzes. Mas também parece ameaçador. Três grandes tapetes vermelhos descem lá das portas pelas escadarias. De repente, eu vi o teatro como um grande monstro devorador de gente, com três línguas lançadas nas calçadas para arrastar todo mundo para a sua boca enorme.”

Já dentro do camarim...

“Comecei a ficar com medo. A sala estava vazia, quase sem luz, e nada da tia Vera voltar. Ouvi alguns sons de instrumentos e aplausos distantes. A música recomeçou. Será que ela tinha me esquecido aqui?

Foi quando ouvi um barulho de coisas chacoalhando e uma voz falando bem baixinho. Não entendi nada, nem vi o que era; numa daquelas estruturas para pendurar roupas, alguns cabides com diferentes casacos balançavam, mais nada. A voz falou outra vez, vinda não sei de onde, e agora eu entendi que alguém dizia: “é só uma menina”.
Como assim, “só uma menina”? Acham que é pouco ser uma menina? Fiquei braba e me levantei da cadeira.”


É ou não é?

Desculpem esta blogueira se pareceu um grande jabá em família. Fazer o quê? Desde que juntamos nossos casaquinhos, tem sido assim.
:o)

Tirando as fraldas

Sim, ela já faz cocô no vaso há algumas semanas (poucas). Mas ontem pediu para não colocar as fraldas, e insistiu. Ou seja, deu certo a super-campanha-subliminar-da-calcinha: há tempos, vínhamos dizendo que ela “já está uma menina crescidinha e, qualquer hora dessas, ia começar a usar calcinha igual à mamãe...”. Pois ontem ela pediu:

- Quero ficar de calcinha, mamãe. Igual a você.

Bingo! Expliquei as regras do processo. Poderia ficar só de calcinha, mas teria que pedir para fazer xixi quando tivesse vontade. Ela me olhou meio confusa, não senti a menor firmeza. Mas também não senti a melhor firmeza quando ela ensaiou os primeiros passinhos, as primeiras palavras... Seja o que Deus quiser, tirei as fraldas.

E fomos para o sofá. Ela se divertia e eu fazia figa. De repente, pediu água.

- Filha, você pode beber água, mas daqui a pouco nós vamos ao banheiro fazer xixi, tá bom?

- Tá bom, mamãe.

Bingo! Bebeu três goles d’água e fez xixi no chão.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Classificados do Casaquinho

Vendo corpo cansado e moído. Motivo: babá vai embora às sete.

Vendo mente exausta iniciando processo de sonolência leve, mas irreversível. Motivo: babá vai embora às sete.

Compro jantarzinho a dois, cinema com pipoca, declarações de amor à luz de velas, passeio de mãos dadas, passeio sem mãos dadas, chopinho com pastel no final do dia e até - por que não? - uma discussãozinha básica na relação.
Motivo: babá. Vai. Embora. Às. Sete!!!

sábado, 5 de setembro de 2009

Passeio na praia

Filha,
hoje saímos a passear, nós três, com você na cadeirinha da bicicleta do seu pai. Eu corria ao lado, e você me incentivava:

- Corre, mamãe! Corre mais!

Você e as suas mãozinhas de boneca segurando o guidãozinho. Você e seus olhos espertos procurando pássaros, cachorrinhos e nuvens no céu. Você e seu capacete rosa-choque, sua alegria, seu pai.

E pensar que saí para correr com meus fones de ouvido, mas corri ouvindo você cantar o samba da Maria Luiza...

Sentido da vida é aquela coisa que responde quando não estamos perguntando coisa nenhuma. É bonito pra chuchu.